terça-feira, 17 de outubro de 2017

PORTUGAL A ARDER ; verão de 2017


 PORTUGAL A ARDER : verão de 2017


                                                    I 
O que aconteceu nesta época em quase todo o país,
Portugal, muitos de nós viveram em décadas anteriores e por vezes sofrendo perdas indescritíveis.

Quase todos os anos, desde há décadas, acontece no verão este desvario em tão
antigo país, o dos Descobrimentos e o do Pinhal de D. Dinis,agora ardido em cerca de 80%. A rainha deixou cair as rosas. Enquanto isso, rezando pelos camponeses, as forças de ataque aos focos (os bombeiros, como sabemos) estavam quase continuamente mobilizados, cerca de cinco meses, apoiados por uma fatia do Exército e pelo desespero, sobretudo no «último dia» dos populares, aos gritos, com baldes, diversas mangueiras de jardim. Quando a meteorologia falhou a chuva, as chamas banquetearam-se com mais uns milhares de hectares, varrendo, nesses derradeiras horas, 238 e aumentando de 40 vítimas mortais as dezenas já desamadas por Deus . Uma comissão independente já entregara o seu relatório sobre a mítica Pedrógão e já os políticos mais desamparados mas excitados com as terminadas eleições autárquicas, ouviam o Primeiro Ministro, pausado, assegurar que aquele relatório ajudaria muito a arrancar com uma nova aventura de ordenação forestal, a par da reconstrução das casas ardidas,  recuperação de máquinas, reposição dos meos vivos e técnicos para uma agricultura bem emparcelada, vigiada e regularmente limpa dos lixos naturais.
Costa foi pragmático e sereno. Ora isto não era compatível com as vitórias autarquicas e a ira da activa Cristas, que pedia desculpas e anunciava uma moção de censura contra o governo da doce geringonça. Tudo isto faz parte da nossa turbulenta existência, mas o momento não era TODO político. Passava por muitas incúrias mas envolvia muitas crises existenciais, a necessidade das pessoas se darem as mãos e reinventarem, contra a dor, um melhor 25 de Abril. Portas e Cristas parecem ter corrido para o jardim das Oliveiras redigir o
golpe abrangente da moção, pensar nas câmaras, brincar aos reinos deles: acabar com a Ministra da Administração Interna, correr com os comandos dos bombeiros, forçar mr Trump a oferecer ao rosto da Europa maqinaria, janelas  de alumínio, alfaias, torres de vigia, planos de terras e árvores reordenadas, assim por diante. 
Chove. Os bombeiros descansam. Agora é fúria pública do ensaio geral: os políticos, sindicatos, gente da face-book ou correntes sociais, todos vão pensar nas cabeças a rolar, nos ministros de bom gosto, nas chamas de um país mais moderno e descongelador de salários, serviço público, enfermeiros, mamutes da banca e das grandes empresas. Pode até acontecer que António Costa tropece e que só os velhos desistam de emigrar.O CDS, que pouco modernizou a nossa agricultura, pensa em florir os campos e avançar com cooperativas, apoiadas por jovens bem pagos, os velhos sorrindo na soleira das portas. Um Portugal mais moderno e bem disposto. Os religiosos agradeceram a Deus não terem ardido os hospitais do SNS. Quanto às escolas, que não ardem mas se encharcam de infiltrações, com menin0s maus batendo nos mais fracos,essa é outra página  e mais justos julgamentos






Nada se podia alargar derepente: mil casas em cinco meses, um novo e moder- níssimo  sistema de comunicações, o uso das calhas para esse efeito, por exemplo, embora a notícia que isso já estava em andamento omita que tal processo precisa ainda de mito tempo e muito dinheiro. Além do mais, é preciso dignificar o enterro dos mortos e cuidar psicológica e materialmente dos vivos (Não estamos a falar do Processo Marquês).
Esperemos, pelo menos, pelo Conselho deMinistros do próximo sábado, no qual se val estudar o ajuizado relatório sobre Pedrógão, desenhado por uma comissão aberta e independente, documento que tem sido muito elogiado, sim senhor, mas que terá de contar com planeadores de várias disciplinas, das vias de comunicação, arquitectura consoante o uso e ligação, a famosa reordenação
da floresta.
Nada disto se resolve com algazarras no parlamento, com muitos meios tecnicistas nos partidos e personalidades qualificadas,como aquele senhor, Ribeiro Telles, que tanto nos ensinou e tanto esquecemos. Cuidado com as grandes cidades e a desarticulação florestal, cargas de eucaliptos e pinheiros bravos. Nada disso, a sufocar gente, repartições, escolas, tudo colado às planta-ções sem água, para os incendiários da romântica queimada descuidarem até ao fim das suas alfaias. 
Somamos aqui a ideia, já atirada para o ar, da criação de um bem dimensionado  Ministério  da Agricultura, reordenamento, formação e tecnolo- gias.











No último dia de incêndios que deflagraram por quase todo o país, como quase sempre acontece nos meses do Verão, o medo, o pânico, a luta entre- tanto acontecida no movimento das populações e chamas explosivas, de que não há memória, surpreendia também os próprios bombeiros , meio retidos pela orografia das zonas abismais, o fogo a subir e a travar quase todas as manobras tentadas em largas extensões de floresta ou lixo sem memória, mangas abrindo água ao máximo, corridas de pessoal civil com baldes, os gritos e as frequentes tentativas de evacuamento de populações em risco, muita gente correndo entre casas e carros,outros encolhidos nos interiores já a fumegar, tudo era enfim «resolvido» para uma fase de combate aos fogos, apesar da ventania e dos urros de duas coisas entretanto semelhantes: a passagem dos meios aéreos vertendo milhares de litros de água sobre as manchas de labaredas e os urros de idosos e novos para salvarem carros tombados e proteger os últimos velhos que a GNR conseguira transportar para lugares de acolhimento, mais tarde para dormirem e comerem, esperando que a manhã não lhes contasse só casas ardidas, gado queimado, bombeiros ainda diante das novas frentes de novos fogos, homens semi-desfeitos de exaustão, sempre a trabalhar, sempre à espera que pudessem descansar. Serviço dantesco e muito difícil de coordenar em áreas imensas, perante fogos contínuos de 30 metros de altura, fumo negro por cima, fechando em negro o céu, torrando os rostos erguidos, ensombrando as paredes de empenas com janelas abertas e destruídas, tochas das grandes guerras do século XX.

Um dia haverá organicamente mais  aldeias, outras
aldeias, habitadas não só por velhos e a enquadrar o
espaço de novas culturas, novos  engenhos e parques industrias, ligados aos géneros destas arrumadas sementeiras, ao património, aos meios de defesa e de produção, sem a necessidade de escarnecer de  ministros, como se os governos tivessem de voar por todos os sítios, sabendo de tudo
além de conseguirem entrelaçar  o dia e a noite, contando dinheiros todos em igualdade, seriedade, solidaiedade. Então indivisível, natural, a população
humana ilumina-se num espaço polis, céus limpos, os quadros alinhados, os excessos apagados, o futuro visto pelos testemunhos e semplesmente em morte. Hoje ainda é difícil perceber como as florestas dos Dembos,   em   Angola,  não  entravam   em    ignição                                                        mesmo flageladas longamente com napalm.

                                                      ROCHA DE SOUSA



segunda-feira, 14 de agosto de 2017

MENSAGEM DE FILOMENA MÓNICA

                                                                 
                                                              OBRA DO DAESH

é
 
                                                 MASSIFICAÇÃO DO CONTRAFEITO

As ordens cumprem-se. Não se discutem, não se avaliam. O mundo troca moeda falsa -- e não é veem eurordade que,à vista desarmada são todas iguais, as moedas? E até os géneros que comemos depois de descongelados? Não vale a pena guerrear por tudo isso, se as fábricas e outras emissoras de bens saltam fronteiras a seu belo prazer, instalando  "lixo" gestionário e tributário um pouco por toda a parte.
Filomena Mónica, que muito admiro mas também escorrega em alguma casca de banana, escreveu na revista  DOMINGO coisas interessantes sobre a gobalização e não se atreveu a tecer alguma considerações sobre as "emigrações desconhecidas" -- gente que parte para distancias alternativas, onde os lugares ainda escapam às multidões e a vida pode ser colhida de auto.procura, de compras elementares e a vizinhança ainda acolhe os outros em jeito de ajuda e de partilha da natureza e das palavras trocadas nos serões após jantares frugais. Não estou a argumentar um retorno a uma qualquer Idade Média de países imaginários. Mas para a globalização se escrever em itálico, tornou-se excepção com  ALTERNATIVA. Conheço no Algarve, desde há largos anos, famílias estrangeiras, de países poderosos, que vieram construir casa na paisagem intimista ou cidades ainda amenas. Vivem da sua reforma e já deixaram a fome dos voos para férias, crescimentos sasonais e demográficos de milhões de pessoas.
Mónica escreve: «Quando vivi no estrangeiro, estavam sempre a perguntar-me por que razão Portugal, um país que no séculoXVI fora capu mundi, tão cedo tivesse entrada em declínio».
A pergunta dessa gente de fora, se calhar a nadar em euros e sem ter emendado nada dos tratados da União Europeia, só se compreende porque fizeram descolonizações de arrasto e até conservam parte da arqueologia relativa às artes gregas, por exemplo, correspondem a civilizações ocidentais que ainda podem humilhar os mais pequenos, gregos e portugueses, por exemplo,  cuja vitória na guerra e na filosofia, no ser e saber, custou milhões de mortes e a aprendizagem das rotas dos mares, dos naufrágios, do exílio e da produção local ou capaz de atravessar oceanos, entre sacrifícios inauditos e piratarias envolventes. Não eram angelicais, os portugueses e até sabiam prever que a pequenez do seu território os convidava a emigrar, não para lavar dinheiro nem para dopar o pão e outras coisas mais idiotas ou malvadas.
Não quero avaliar a bondade da maneira de comprar roupas, durante cerca de 50 anos, através da Marks & Spencer, fundada em Leeds, não precisando  de fazer a sua sede pagadora de impostos além fronteiras, o que inverte logo a equação.
E que graça (peço desculpa) pode haver no facto de se comprar prata na Ásia, enrolar tal valor na bandeira portuguesa, e oferecer o «bolo» ao neto? Que coisa significa o quadro de Rosseti (descoberto em 2009) senão um efeito «escrevo» de quantidade, por fim cópia,  depois fingimento de coisas com marcas compradas e pegadas às novas  contrafacções, via que chegou a uma desfaçatez globalizante e noutros tempos podia abrir conflitos armados.
Filomena aconselha a deixar esta questão: «o que podemos e devemos fazer é conseguir bons tratados comerciais. O resto são delírios».
Um amigo meu  mostrou o seguinte: «Isso é bom. Tenho maneira de vender gato por lebre, tudo bem embalado, e um escritório de advogados para me redigirem um bom tratado de comércio, global, naturalmente.

notas de Rocha de Sousa

segunda-feira, 31 de julho de 2017

O EIXO DO MAL ou mais CHARADA COM PALAVRAS SOBREPOSTAS

EIXO DO ÓDIO À CLAREZA

                                   



BALBÚRDIA OU CHARADA SOBRE PEDROGÃO

                                                       
                                             O CÓMICO E A DOUTORA

Estive a ver mais uma vez o Eixo do Mal, com estes admiráveis senhores que se podem ver nas imagens, incluindo a senhora (Clara Ferreira Alves), cujas intervenções, apesar das palavras soltas com que os companheiros a interrompem, tem o condão de nos dar a entender o tema do debate e a lucidez de mostrar as verdadeiras faces do assunto. Logo no início, todos estão rabujentos por querer falar; e, a breve trecho, tudo se confundiu em charadas, gritos, obscuros argumentos e juizos patéticos. O coordenador, que foi posto no programa não se sabe para quê, não fala nem ata nem desata, impedindo-se de berrar um «calem-se!» Se dizem que os portugueses confundem tudo sem dizer coisa com coisa sobre Pedrogão, como querem que eles os ouçam se estão todos a falar ao mesmo tempo, interrompendo-se, borrando a opa, dizendo e desdizendo, quase a insinuar que Pedrogão é um mistério maior que toda a teoria da conspiração? 
Eles: Ninguém está a interromper, eu preciso de acabar, o Daniel não se cala, roguem a outros que nos permitam usar mais tempo. O coordenador: OK. Vamos fazer um intervalo e ouvir o que Donald Trump tem para nos dizer.
Aparece no ecrã o Presidente dos Estados Unidos: Leiam o Twitter: está lá escrito que os senhores são burros porque matam os mensageiros todos e deixam a pobre senhora repetir o que sempre diz mas com um bom português e numa escala breve e sóbria. Nunca fui a Pedrogão mas sei que os portugueses, depois de voltarem do mar lhes dá para serem pirómanos ao mais leve aumento do calor. Ponham os olhos no vosso Presidente: quem  me  dera poder
seguir aquele exemplo.

Rocha de Sousa

segunda-feira, 26 de junho de 2017

PORTUGAL ARDE E PERDE OS SEUS BARCOS DE FUNDO

No centro do país, em Pedrogão Grande, aparentemente a partir de uma trovoada seca e de um raio fulminante, desfez-se uma  grande árvore. É certo que  ninguém estava lá para ver e gritar os primeiros alarmes. Mas tudo se viu após o desenrolar da catástrofe, um incêndio de chamas altíssimas e cavalgantes, mordendo brutalmente os "mastros" de milhares de eucaliptos e pinheiros bravos. As aldeias por ali ficaram em perigo. As comunicações perderam-se ou nem chegaram a acontecer na devida conta de urgência. Todas as forças que se dirigiam para aquela zona não cortaram uma das estradas principais. Aviões canadair foram enviados num pedido de socorro do governo português, vindos da França, da Itália, da Espanha. Na estrada aberta por esquecimento e aflição entravam carros fugindo e pouco depois percebiam (os condutores) que estavam diante de um alto cenário opacificante jamais visto por todos aqueles desgraçados, cada vez mais desorientados, sem ver, batendo uns nos outros, morrendo de sufocação e, pouco depois cremados nos carros em chamas. Tudo foi um horror, uma tragédia, e toda a gente que seguia tal desastre já desatava os mesmos preceitos contra as autoridades e proprietários, as manchas absurdas de eucalipto e pinheiro, a falta de espaços intercalares e limpeza da caruma, bem como os gananciosos que levavam o "zelo" a plantar eucaliptos rentinho à berma da estrada e não a dez metros, como manda a lei. Todos os anos é assim, todos os anos a baralhada de meios e contradições na Assembleia da República responsabilzam uma gente esquisita, pirómanos psicopatas e políticos e corrruptos. Mas no ano seguinte verifica-se que não se fez nada  e a bela paisagem que temos vai sendo abandonada a leste, com poucas aldeias e muito poucos habitantes, já incapazes de produzirem o suficiente para a sua inacreditável solidão.



O governo deveria descentralizar centenas de  actividades, construir no interior, abrir espaço em concordâncias de todos os tipos, bem vigiadas, bem geridas, bem pagas. Não se trata de fazer mais turismo por lá, com hotéis e hotéis  rasos e lagoas para nada. Precisamos de inventar o OUTRO LADO do país, replantar na devida ordem científica o que preguiçosamente não existe por ordem tola do dinheiro, bancos atirando acções à rua. Cada vez mais se espera mais que se deixem de corridas à boca do fogo, talhando comissões políticas já-já, partidarizá-las, tudo num grande desarrumo, entre demandas e vozes sobrepostas, impossíveis de puxarem grande desarrumo, entre demandas e vozes sobrepostas, impossíveis de puxarem o pensar e o sentido plausível para uma ordem da paisagem e do design que saiba como as estradas se fazem em nome de um futuro para mais gente, menos imigrantes falsificados e sobretudo a inovação no espaço agrícola, moderna e limpa.
A Europa? Mas a Europa foi antes, está em mutação, aceita como boa a Globalização e os seus pontos de ordem, entraves, querelas, povos sequestrados. 
Se me lembro dos barcos? Desde as caravelas às viagens  de achamento de terras, idas e vindas, cargas e descargas. E também vi, na primeira década depois do 25 de abril de 74, grandes máquinas serrarem navios cargueiros. Não sei se os negociavam, enferrujados, ou como tratam hoje milhões de toneladas de ferro enferrujado e de madeira queimada. Havia um  homem na minha terra que dizia destas coisas: "javardices".

Rocha de Sousa (em apuros)

terça-feira, 14 de março de 2017

RETROCESSO CIVILIZACIONAL

As escolhas destes dias cinzentos sujam, cada vez mais, as grandes memórias anteriores a Deus; as coisas que a gene diz:

1. Eles abrem as televisões: o ecrã enche-se de lixo e ruído. O cartel da publicidade, entre todos os canais, aparece em todo o lado, sufocante, insistindo nos carros, nas comidas e nos zelos em tudo o que parece estúpido e é tratado como Alice no País das Maravilhas. Ou a rapariga do Trivago que nunca mais despiu a camisinha azul-qualquer-coisa. À hora da publicidade as urgências hospitalares enchem-se ao máximo: são os de meia idade que aguentaram três horas de televisão, viram duas de publicidade e já não esperavam mais tortura. Já contei meias horas de publicidade. Em geral, o som está sempre puxado até à ponta das nossas pobres orelhas.
As novelas portuguesas (porque as compradas ao Brasil perderam toda a dignidade) mostram a grande intuição interpretativa dos nossos actores. Era melhor gastar aquele dinheiro em cinema. Seja como for, as novelas têm qualidades de imagem, rigor formal, interpretação. Perdem quase todas as virtudes por se encharcarem de musiquinhas e canções, cançonetas, palermices intercalares. Os Realizadores ainda não perceberam a importância do silêncio e das falas sem musica em painel. Esticam Guionistas e eles esticam o argumento, salpicando tudo de pretensas lições de moral. O mal impera, truques, maldades, amores em estado indistinto. Nunca aprenderam a fingir sexo na cama sem começar por despir primeiro as camisolas e nunca tocam nas calças e nunca mais perceberam a caricatura daquilo. Nem mesmo alcançaram os modos de sugerir os corpos nus sem fazer mal a ninguém. Há disso sem um pico de amoralidade; mas esta simetria (em baixo) não se parece com nada. Ou melhor talvez se pareça com uma despedida antes do Haraquiri.


Há disfarces que são mais pornográficos. Exemplo: tiram a camisa (eles) e ficam em tronco nu. Elas tiram a camisa e ficam em soutien. Começam assim e nunca mais se vê cair a ganga ou ele puxar o soutien com um mínimo de ternura. Fungam. Fazem caretas nos primeiros planos. E, noutros casos, metem-se num corredor meio escuro, à americana: ela encosta-se à parede e ele a ela, O homem simula que levanta sem esforço a rapariga para que ela levante a coxa visível e o suficiente para que isso nos faça intuir o espaço aberto entre essa anatomia e a outra, de pé. 
De política, o horror está no tamanho do último minuto, quando o Mendes é avisado que já só tem dez segundos. 

2. Em Futebol há, nos canais todos, umas dezenas de "marretas" que se sabem de futebol não demonstram: berram todos ao mesmo tempo e não abordam uma única questão de fundo, de ética no desporto, de talento e técnica, de espírito de entrosamento e de corte aos embates, rasteiras, pontapés nas canelas, tudo o que se paga, no mínimo, por uns milhões de euros. O Futebol é um dos maiores embustes contra a civilização, amoral, patético, caríssimo, sem tecnologia de julgamento, imitando no cume, entre marcas no peito e nas costas, essa governação esquisita que temos tido à medida que o 25 de Abril se desvanece.

Seguiremos, um dia, com outros temas  para educar o olhar e aperfeiçoar a percepção do país que fomos fazendo.
                                                                               
3. A última vez que fui ao cinema, convenci-me  de que "Interestelar" era obra de mérito. Mas faltava-lhe aquele credo do esplendoroso cinema de Tarkovsky ( "Solaris" e os outros) visto ainda em pequenos estúdios mas tecnicamente aceitáveis. Resolvi respeitar o "Interestelar" e meti.me ao acaso numa das caixas de fósforos do Amoreiras, tendo sido imediatamente cercado de palavrões de um jovem público, namorados beijando-se sem fogo, pacotes de pipocas sobre os joelhos. E um som aterrador saindo das colunas, em sincronia com os filmes publicitários. Quando o filme começou (acção americana) um carro era perseguido pela polícia. O ruído atroava a ossada dos ouvidos. Protegi os tímpanos com um dispositivo comprado na farmácia e tentei seguir aquela fabulosa abertura. Por estranho que pareça o roncar dos pneus no asfalto parecia acompanhado de pedrinhas a estalar, expelidas para fora da estrada sob o efeito da velocidade  a par do uivar da borracha. A uma paragem do trânsito todo, o estalar das pedras continuava a ouvir-se, coisa que procurei perceber, entre as vozes das personagens enquanto esperavam a abertura dos sinais. Não era nada que saltasse do ecrã. Eram as dentaduras de cerca de cem espectadores, pacote ao peito, retirando nervosamente pipocas do interior e trincando-as como ratos gigantes. Assim foi durante mesmo todo o filme, no qual  foram destruídos cerca de vinte viaturas e se assistiu a um assassinato na noite de Los Angeles.

4. No último concerto que ouvi, ao ar livre, no anfiteatro da Gulbenkian, ainda não havia pipocas e a instituição não toleraria esse bizarro vício perante uma orquestra estrangeira, de grande gabarito, a tocar Beethoven. Quando o espectáculo terminou e as pessoas se retiraram lentamente, fiquei um pouco para trás a olhar alguns cuidados do programa. Quando decidi levantar a cabeça e iniciar a marcha, algo me assaltou o olhar revirado: todas as bancadas, e parte do próprio chão fronteiro a elas, estavam completamente coalhadas de cascas de rebuçados e chocolates, livretes do programa, jornais (inclusive), lenços de papel, amarrotados. Na Gulbenkian? Da classe média alta?


5. Nas ruas, às seis horas, o trânsito quase pára, e mais de metade dos carros meio estacionados apitam como se o mundo estivesse para acabar. Uma senhora fora atropelada junto da rua das Pretas e ouvia-se já a gritaria da sirene do INEM. Nessa mesma noite, li no outro dia, no "Correio da Manhã", que houve entretanto dez crimes, mais uma morte de mulher, rachada a machado pelo marido, numa casa da rua das Colónias. O mesmo jornal documentava o desaparecimento de uma menina de 13 anos, certamente por influência das "redes sociais". Os pais haviam encontrado fotografias de um rapaz e bilhetes amarrotados. Um deles indicava certo café de Braga, 10 horas, dia 15. Uma tal Maria Joana, que trabalhava no interior, perto de Viseu, fora presa no casebre que habitava com o amante e onde tivera uma filha, na altura ainda bébé. No outro dia, os jornais falavam do caso com grande alarde, pois constara que a menina bebé desaparecera, havendo sulcos de sangue, e muito em breve apareceu numa grande caixa de lixo, aos bocados, o corpo da pobre criança.

6. Fora primeiro ministro e acabara, derrotado, nas ruas de uma remota cidade europeia. Tinha amigos em  Portugal e com eles trocou favores: anos depois os amigos foram acusados de lavagem de dinheiro e de transferências de grandes fortunas para empresas que, por sua vez, estavam sendo manipuladas e a caducar perante um assalto sistemático de Grandes Grupos da União. A maior Empresa de Transmissões, vai sendo abocanhada por outras, estrangeiras. Neste vórtice de milhões veio a descobrir-se um rol de 27 pessoas ligadas ao empresariado e à Finança, entre políticos e gestores de bancos falidos. Dez mil milhões de euros, num milhar de operações, haviam sido encaminhados de Lisboa para a Suiça, além de outros lugares muito dados a burlas deste tipo, para diversos offshores.

7. A União Europeia resultou de propostas e importantes reflexões de personalidades de grande relevo. Infelizmente, os executores desse Projecto começaram a borbulhar no espaço destas nações e basearam as suas propostas num errático montão de tratados contraditórios entre si relevados perante as anteriores perspectivas de um grande espaço, inter-relacionado com o mundo, aberto para si próprio, solidário no melhor entendimento da modernidade.


                                                            euromania

Mas a grandeza das construções sediadas em Bruxelas imitam um futuro modelar enquanto os seus viventes parlamentares, comissários, presidentes e muitos outros, ficam boiando em dinheiro e retórica  sem  abrir  nem  reciclar  os tratados, impondo aos países da União, com pouco respeito pelos seus orgãos de soberania, regras e regras de aperto, de contracção, em nome de um amanhã afinal anémico, contraditório, prisioneiro das caturrices de países enfadonhos, ricos, a lembrar o belicismo dos anos 30 a 40 do século XX. Assim, a Inglaterra retira-se da organização, num brexit que mais parece uma batalha de funconários, parlamentos a abarrotar, dois anos de trabalhos e talvez uma década para tudo isso acabar, enquanto, pelo caminho, outras vontades de libertação do cerco começarão a tentar lançar clareza à Comissão Europeia, aos snobes países do Norte, ao Parlamento, à centralizadora Alemanha, a abarrotar de euros, refugiados e regras após regras.

8.  Portugal, bem vista  a figuração da geografia, é centro do mundo, é  "rosto da Europa". Sofre de muitos males que invadem os territórios povoados, ou muito povoados, enche-se de lixos e, embora também polua o oceano, esquece-se das antigas descobertas marítimas, perdeu barcos, não quer ou nem pode dedicar-se a uma relação profunda com o estudo científico das profundidades marítimas, nem sequer explorar o eventual petróleo existente na área da sua plataforma oceânica. Nisso talvez tenha feito bem, como não construindo centrais nucleares. Acompanha os outros em produzir lixos assassinos, como estas imagens indiciam. No mar e em terra.

um dia  saberemos desbravar estas notas e avançar para uma civilização limpa


A DISSOLVIDA ORDEM DAS SOCIEDADES

                                                           pintura de Paula Rito


    Envelheço a pensar nos serviços prestados e no equívoco que me envolveu o espaço das ideias e dos sonhos, atrasos, pluralidade nunca reconhecida sem favores, a pobreza dos meios entre olhares de ileteracia e as pausas entre rostos esplendorosos, inúteis contudo, escorrendo, patéticos, na sexualidade mal aprendida, tendencialmente sub-cultural.
      O tempo em que se  lia Sartre ou Camus, comoventes aprendizagens do sentido existencial de tudo em volta, a despeito das sombrias horas de equívoco, a náusea ou o absurdo, polos decisivos  da nossa alma assombrosa e assombrada, perdas a sangrar nas derrocadas irremediáveis, das mortes inúteis, de um cada vez maior retrocesso do saber e do lado maravilhoso de milhões  de coisas descobertas, de obras eleitas, de cidades soberbas que o tempo e uma demência geral cada vez maior foram arruinando e desfazendo sob a cegueira de novos raivas, pela multiplicação dos deuses e das vagas criminais cujo avanço misturava finanças de suborno com produções poluentes, apesar do esforço da ciência médica  abalada pelas lamas entre lixos ou apodrecimentos  talvez invencíveis, num planeta cuja beleza e sentido vital haviam  alcançado o espanto dos povos modernos ao descobrirem que a doença dos grandes espaços era sobretudo detonada pela voracidade de uma civilização global incapaz de se entender com as escalas ou as grandezas mal desenhadas para o alongamento pacífico dessa fábula genética e dos entrosamentos futuristas da biologia sem igual nas molduras mais remotas, parecendo parte de sistemas sem falhas. 
           Inventou-se Deus para explicar tudo, numa tentativa de dar sentido ao que nos escapava e consolidar o Universo, essa infinita aparência sem dimensão racional e um quadro plausível ao nosso entendimento, solitários de biliões de lugares distantes da Terra em contagens como biliões de anos luz, toda a impossibilidade de viajar em nome de novos achamentos e relações capazes de densificarem os vazios de tais distâncias entre tudo e nada ao nível da nossa percepção do visível, num espaço capaz de conter a impossibilidade das nossas narrativas.

        Aqui me encontro sem me saber de forma razoávelmente apreensível, apesar da morte e do nada atravessado por novos nascimentos, seres à primeira vista confiáveis, abertos à paixão, e contudo submetidos em pouco tempo aos perigos do mais rasteiro dos maniqueismos ou fixando-se em novos destinos  naquela que será uma noite infundada e total.
            Penso: porquê e para quê? Olho em volta e o excesso das fraudes sufocam povos inteiros, criando oásis de maravilha, algo que parece conceder a felicidade a alguns homens  e que, após meia dúzia de séculos, se tornarão silêncio de pó e restos sem nexo. Hoje, na odiosa geminação do mundo global, a paz apaga-se na histeria das multidões e nas centenas de conflitos armados que desmembram a beleza do passado e queimam o sucesso técnico dos novos sucessos. Milhões de pessoas reduzidas à miséria e ao desespero migram entre mares e terras, após chacinas, carregando a saudade das suas origens, no apelo ilusório do lugar para ricos e à saúde dos velhos entretanto meio cegos, meio mortos, entre valores imperiais acerca dos quais me faltam palavras.

sábado, 4 de fevereiro de 2017

O MUNDO DAS HORAS PERDIDAS


transfiguração de um
imperador da Roma antiga


UM ESTRANHO À BOCA DAS URNAS


Este segundo milénio abriu o calendário de forma enviesada e fracturando-se em várias dezenas de guerras que nem sequer simulam a última, dita mundial. Depois das querelas dos israelitas, implantando um país de ponta a ponta, por força de antigas nações coloniais, na insanidade de expulsar ou irradicar de si mesmos os palestinianos, uma falsa culpa de todos em todos foi implantando na faixa dos pesadelos um resto de descolonizações brutais, sem memória nem ética, enquanto os EUA, secretamente ou por feio abuso, perfilhavam negócios a leste, no declínio da guerra fria, mostrando mesmo na televisão grandes carros  transportando caixas com supostas armas nucleares, ao longe, no Iraque, supostamente em obscura traição de Hussein contra um Ocidente de mistura laica e religiosa. O presidente Bush apelou aos aliados e, caindo ou não na armadilha, decidiu uma guerra contra o Iraque, sem rei nem roque, cuja verdadeira finalidade não foi encontrada nem alguma pedagogia de alianças soube esboçar. Recuou erraticamente, bebendo água do Luso e repartindo o esforço, ao matar o ditador Saddam e procurar oferecer ao país os soldados iraquianos treinados militarmente.

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Um dia, bem tarde, com guerra na Síria e em parte do Médio Oriente, o primeiro presidente afro-americano dos EUA, Obama, após um trabalho ponderado, em geral bem compreendido, o seu mandato chegou ao fim sob o "atentado" de um candidato da riqueza e da direita sem fígados, Donald Trump. O mundo globalizado, cheio de sombras, lixos, tecnologias cada vez mais sem medida, encheu-se de carnavais televisivos e outros, durante as eleições primárias nos EUA: aquele Trump poderia encarnar um cowboy dos melhores tempos, mas fazia as suas viagens berrando insultos: que era preciso acabar com tudo o que se excedera na corrupção, terminar com as vagas de emigrantes, migrantes daqui e dali, expulsar os ilegais, fechar a entrada do país a todos os muçulmanos, gente e gente que transportava terroristas entre si, nunca mais a tolerância de misturas sem princípio, criar muros face ao México .
O homem de cabelo dourado, já príncipe da América, desatou então (aí o temos) a decretar tudo, montes de ideias radicais, assinando com uma caneta de feltro, aos bicos, e mostrando tudo de frente para a televisão. Nada disso está legalizado pelas estruturas competentes, mas já os aeroportos se baralham e as famílias separadas em viagem temem pelo seu futuro, a Europa sem norte, perdida de si e da cultura que a definia. O mundo incha de efeitos maléficos, não há cirurgia que o salve ou redima dos erros da esplendorosa globalização das primeiras décadas do século XXI.
Que o gelo deslizante nos socorra e a infecção se contraia.